
Em março deste ano escrevi um artigo para este mesmo site delineando onze características subjacentes aos discursos e práticas dos líderes e integrantes do Movimento Brasil Livre (MBL)[1]. Na ocasião, argumentei que os discursos do MBL --- um exemplo notório do que é e do que significa a nova direita brasileira --- são marcados por uma narrativa pobre, simplista, binária, infantilizada, seletiva, tendenciosa, teologizada, moralista e idealista da realidade social, econômica e política nacional e internacional. Com base na análise dos discursos dos integrantes deste Movimento, afirmei que a construção de suas narrativas é pautada por valores e princípios formulados a priori, isto é, ideias abstratas sobre o real que não possuem respaldo empírico na própria realidade. Afirmei ainda, que esses valores e princípios são levados tão a sério pelo MBL que acabam se tornando dogmas, isto é, ideias que não são passíveis de questionamentos; asseverei ainda mais que uma das consequências desse arcabouço dogmático é o monopólio da verdade e da bondade (ou da moralidade) presente em seus respectivos discursos e narrativas, uma prática que nega (ou afirma ser falso) tudo aquilo que contraria suas ideias.
Como o artigo citado nasceu das observações dos discursos e de uma análise crítica das fontes teóricas e ideológicas do MBL, é claro que ele recebeu não só elogios por parte de colegas da esquerda e das ciências humanas e sociais em geral --- como historiadores, geógrafos, sociólogos, antropólogos, cientistas políticos e economistas ---, mas também muitas críticas duras --- porém pouco construtivas --- por parte de simpatizantes do MBL e simpatizantes situados à direita do espectro político brasileiro atual. Diante de um texto que não apenas tentou revelar, delinear e sistematizar, mas também criticar a prática discursiva do Movimento --- apontando as contradições e fraquezas dessas ideias --- é evidente que ele causou desconforto e reações contrárias por parte de integrantes e simpatizantes do MBL. O mais interessante desta experiência foi perceber o tom e o caráter dessas reações: elas corroboraram quase todas as onze características delineadas no texto[2].
Assim, verificado in loco os acertos do artigo, dei prosseguimento às análises do universo ideológico do MBL e da nova direita em geral. Nestas novas análises me deparei com uma característica crucial e inerente às correntes situadas no campo da nova direita, característica que está implícita no artigo anterior e que aqui merece ser explicitada: o critério e o método utilizado para interpretar --- e, com isso, revisar e reconstruir --- a História e os acontecimentos políticos do passado, visando com isso justificar suas teses, narrativas e discursos. Ou seja: a nova direita em geral --- e o MBL em particular --- tem uma maneira muito peculiar de compreender, interpretar, construir e julgar a História, os acontecimentos humanos no tempo ou os fenômenos sociais, políticos e econômicos do passado. É sobre isso que gostaria de tecer algumas considerações no presente artigo.
Como a maioria dos porta-vozes da nova direita não são historiadores de formação, profissão e ofício --- a exemplo de Leandro Narloch, autor do “Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil”, bem como Evandro Sinotti, autor do (infelizmente) best-seller “Não, Sr. Comuna”, o qual fiz uma pequena sinopse crítica na época de seu lançamento[3] --- suas relações e diálogo com o passado enquanto objeto de estudo, análise e interpretação passam muito longe dos métodos e técnicas da ciência historiográfica, um instrumental técnico da História muito debatida ao longo do século XX pela comunidade internacional de historiadores, e muito bem sistematizada em manuais de historiografia e filosofia da História a partir da segunda metade do século XX, a exemplo das obras do grande historiador brasileiro Ciro Flamarion Cardoso[4].
Apesar de haver controvérsias entre as diferentes narrativas e linhas interpretativas de um mesmo período da História, a tensão entre elas não expressam necessariamente o conflito de ideologias antagônicas, mas de tendências teóricas diferentes, o que indica certo pluralismo de ideias e de teorias da História dentro da ciência historiográfica. Com efeito, apesar de haver pluralismo teórico, há certo consenso metodológico em relação aos procedimentos e técnicas de coleta de dados e análise de fontes e fatos históricos do passado.
Um dos mais importantes procedimentos metodológicos de análise historiográfica é em relação ao anacronismo. Sumariamente, anacronismo é o termo técnico utilizado para explicar um erro analítico de cronologia que consiste em atribuir a uma época (ou a uma personagem histórica) ideias, valores e sentimentos que são de outra época (ou que não pertenceram à época analisada)[5]. Um exemplo clássico de anacronismo --- neste caso, um anacronismo intencional --- é o desenho “The Flintstones”, que reúne em sua narrativa elementos históricos e sociais que não conviveram entre si: as relações capitalistas modernas entre seres humanos e dinossauros na idade das pedras. No entanto, no caso dos Flintstones, o uso do anacronismo é uma espécie de licença poética cômica, apesar de alguns críticos observarem muito bem que este desenho pode ser uma tentativa de naturalizar e eternizar o capitalismo, afirmando que sempre houve capitalismo na história da humanidade, algo que a própria ciência da História nega com todos os respaldos empíricos. Outro exemplo clássico e muito comum de anacronismo --- neste caso, um anacronismo não intencional --- é tentar classificar os valores e princípios do Cristianismo como “de direita” ou “de esquerda” e, mais ainda, tentar definir as ideias e atitudes de Jesus Cristo como socialistas, algo muito comum feito em debates estéreis nas redes sociais. Isso é anacrônico porque os conceitos de direita e esquerda nasceram e se desenvolveram no período pós-Revolução Francesa e, portanto, não podem ser usados para analisar, definir e explicar valores, princípios, ideias e ações realizadas antes desse período. Ou seja, em termos historiográficos, é possível afirmar que Jesus foi dissidente em relação aos princípios e valores ideológicos e políticos de sua época, mas não podemos afirmar com isso que sua atitude de dividir o pão e os peixes reflete uma mentalidade política e ideológica “de esquerda” e “socialista-distributivista” em relação ao governo da época. Julgar as ações de Jesus desta forma é incorrer em anacronismo.
Como pudemos obervar pelos exemplos citados, o anacronismo expressa não apenas um erro cronológico e um erro de conceito no tempo, mas uma parcialidade do pesquisador em relação aos fatos do passado. Dito de outra maneira, quando analisamos, interpretamos e julgamos uma época remota com base nos valores e ideias de nossa época --- atribuindo a estas épocas e fatos do passado conceitos atuais --- praticamos o anacronismo. Analisar e interpretar épocas passadas abstendo-se ou despindo-se dos nossos valores atuais não apenas evita incorrermos em anacronismos como também permite ao pesquisador do passado alcançar certa objetividade e imparcialidade em relação à pesquisa do passado. E essa é uma das principais características que permite à História ter um estatuto e um valor científico, sendo ela um ramo da ciência, mais especificamente um ramo legítimo das ciências humanas e sociais, com suas técnicas, métodos e procedimentos científicos próprios.
Mas o que tudo isso tem a ver com a nova direita? Vamos lá.
Pelas observações feitas, percebi que a análise e interpretação da História feita pela nova direita é geralmente anacrônica. Como dito anteriormente, os teóricos e intelectuais orgânicos da nova direita brasileira que fazem análises e interpretações do passado não são historiadores de formação e ofício[6]. Uma vez distantes não só da comunidade de historiadores, como também das práticas científicas historiográficas exercidas por estes profissionais, os intelectuais da nova direita brasileira produzem narrativas e interpretações sobe o passado à revelia ou alheios às regras, técnicas, métodos e procedimentos científicos desta área do saber. À margem desses procedimentos, as narrativas históricas da nova direita brasileira promovem uma gama de anacronismos em suas interpretações sobre o passado, sendo esta a base do atual movimento revisionista da História, encabeçada justamente por estes pseudo-historiadores situados à direita do espectro político nacional atual.
Ao analisar a produção historiográfica da nova direita brasileira, percebi que eles julgam os fatos e acontecimentos do passado a partir de valores atuais. Melhor dizendo: eles recorrem àqueles valores e princípios a priori --- apontados no artigo anterior --- para interpretar e narrar os acontecimentos humanos do passado. Dito de outra maneira, os valores e princípios abstratos e dogmáticos levados a cabo pela nova direita é encarado como uma espécie de régua para medir e interpretar os fatos do passado, julgando todos os acontecimentos do passado a partir de um único conjunto de valores: os de sua linha e tendência política e ideológica.
Um exemplo: parece ser consenso entre os grandes historiadores da economia que, apesar da realidade social grega antiga possuir uma vasta e dinâmica estrutura de comércio, com portos marítimos, mercados, comerciantes, proprietários privados, moedas e uma complexa teorização sobre esta relação econômica --- tal como a crematística proposta por Aristóteles --- isso não significa que houve capitalismo na Grécia antiga, tal como afirmam alguns intérpretes e ideólogos da nova direita. Da mesma maneira, apesar de algumas cidades-estados gregas antigas terem sido o berço de uma primeira tentativa de regime democrático direto, isso não significa que as propostas na Ágora versassem qualquer conteúdo de cunho democrático liberal, como afirmam esses mesmo intérpretes e ideólogos da nova direita. Ignorando a particularidade grega antiga, lastreada por relações econômicas e sociais escravocratas, os intérpretes da nova direita costumam afirmar anacronicamente que a estrutura e as relações de comércio entre as cidades gregas, somada às deliberações de cidadãos nas praças públicas, são elementos que configurariam capitalismo e liberalismo na Grécia antiga. Ou seja, com base na régua de seus respectivos valores e princípios a priori --- ou de acordo com o que eles definem idealmente por capitalismo e liberalismo --- esses intérpretes do passado chegam à pitoresca conclusão de que houve capitalismo e liberalismo na Grécia antiga; e, pior do que isso, afirmam ainda que filósofos como Sócrates, Platão e Aristóteles forneceram as bases para uma mentalidade coletivista anticapitalista e antiliberal, a exemplo das teses e posicionamentos de Platão em “A República” e de Aristóteles em sua “Política”, nas quais ambos afirmam que o bem-estar da cidade e da comunidade precede e tem maior importância valorativa que os indivíduo e seus interesses privados[7].
Outro exemplo ilustrativo é o trato político e ideológico com a categoria de “Estado”. Na régua de valores e princípios abstratos da nova direita, a defesa e uso do Estado são vistos como práticas necessariamente “de esquerda”, algo que, segundo a nova direita, é uma característica essencialmente socialista e antiliberal por definição. Para a nova direita, sociedades marcadas por Estados interventores na sociedade civil --- e mais precisamente na esfera econômica e do mercado --- são taxados de (e como) governos socialistas, independente do grau de intervenção desses Estados e independente do período histórico analisado. Neste imaginário, cria-se uma noção a-histórica --- isto é, um conceito abstrato, fora da história e sem respaldo na realidade --- de que “Estado é igual a socialismo e igual a antiliberalismo”.
É a partir dessa régua previamente formulada (Estado = socialismo e antiliberalismo) que a nova direita se debruça sobre o passado e o interpreta-o. Com base nessa régua, ao detectar ao longo da história uma sociedade qualquer marcada por uma forte intervenção estatal na sociedade civil, julga-se que esta sociedade possuía um governo socialista. É esta maneira anacrônica de analisar o passado que conduz, por exemplo, à interpretação equivocada sobre o nazifascismo. Isto é: dada a régua da nova direita (Estado = socialismo), chega-se à conclusão de que o desenvolvimento particular do fascismo na Alemanha (o nazismo) foi um movimento de esquerda que resultou em um governo socialista. É ainda com base nesse procedimento anacrônico e anti-historiográfico que a nova direita costuma afirmar que os Estados de bem-estar social das economias centrais do período pós-guerra eram governos “de esquerda” (e até “socialistas” em certa medida) porque havia intervenção do Estado na sociedade civil. E é ainda com base numa definição prévia de liberalismo --- e que, no fundo, expressa apenas a falácia do escocês de verdade --- que a nova direita conclui que John Rawls --- filósofo político norte-americano pertencente à corrente chamada “liberalismo político e social” --- seria “de esquerda”[8].

Com base no exposto, percebe-se que a maneira como a nova direita se relaciona com o passado é contrária às noções básicas da ciência historiográfica, quais sejam: 1) que a história não se repete; 2) que a história das sociedades --- em toda sua diversidade espaço-temporal --- não segue padrões universais e necessários como os fenômenos naturais; 3) que as sociedades mudam ou transformam-se em todos os seus aspectos ao longo do tempo, sejam estes aspectos econômicos, políticos ou socioculturais; e 4) que analisar e interpretar os fatos e acontecimentos do passado a partir de ideias e conjuntos de valores atuais é incorrer em anacronismo.
Assim, dado que os atuais intérpretes e intelectuais orgânicos da nova direita não são historiadores de ofício, situando-se à margem da comunidade de historiadores profissionais e demais cientistas sociais, a compreensão, análise e interpretação do passado (e do presente) feita pela nova direita não obedece às regras, normas, métodos e técnicas consolidadas pela ciência historiográfica e que pauta o ofício do historiador --- ditames estes que, vale ressaltar, foram gradualmente estabelecidos pela comunidade de historiadores ao longo do século XX e que passaram pelo crivo destes profissionais que de fato conhecem e dominam a maneira de produzir narrativas, interpretações e conhecimento historiográfico. Em outras palavras: a maneira como a nova direita analisa, interpreta e produz narrativas históricas não é científica porque não obedece os critérios e métodos científicos estabelecidos pelos profissionais da área, produzindo com isso uma gama de narrativas pseudo-históricas anacrônicas, distorcendo a História humana e difundindo informações equivocadas, controversas e falaciosas.
Face ao exposto, é importante ressaltar que os argumentos e as observações críticas apresentadas até aqui não induz ou não nos conduz à uma defesa velada da neutralidade científica. Em outras palavras, não quero dizer com todo o exposto que a subordinação do pesquisador aos critérios e métodos estabelecidos pela ciência historiográfica --- que evita o anacronismo e que levam a uma mínima imparcialidade do pesquisador frente aos fatos históricos --- implica necessariamente em neutralidade científica, pois, atualmente, a própria comunidade de historiadores reconhece que, em matéria de ciências humanas e sociais, não há neutralidade científica em sentido absoluto. No entanto, a reconhecida ausência de neutralidade neste âmbito do saber por parte dos profissionais da área não significa que a produção historiográfica seja dominada por proselitismos políticos, ou que haja uma clara e dirigida intenção ideológica na produção e divulgação da História, tal como argumenta a nova direita brasileira, que costuma afirmar que os alunos da rede pública --- do ensino fundamental aos departamentos das grandes universidades --- são doutrinados por professores comunistas[9].
Afirmar que a ciência historiográfica não é neutra não significa dizer que a interpretação e narrativa dos fatos e acontecimentos do passado é parcial. Muito pelo contrário, o cuidado da ciência historiográfica frente ao anacronismo é um exemplo claro de que é possível analisar e interpretar o passado de maneira minimamente imparcial. Quando historiadores narram em suas obras que os processos econômicos e políticos da idade moderna foram marcados pela forte intervenção de Estados absolutistas na sociedade civil da época, isso não significa dizer que eles foram socialistas, pois neste período histórico: 1) ainda não havia uma doutrina, uma ideologia, uma prática e, portanto, um movimento socialista ao qual se pudesse chamar de socialismo; e 2) a forma, o estilo e o regime de governo destes Estados eram qualitativamente distintos da forma, do estilo e do regime de governo idealizado, teorizado e praticado pelo assim chamado “socialismo real” do século XX. Assim, analisar a idade moderna a partir da realidade concreta deste mesmo período --- e não com base em ideias e valores da atualidade --- já implica uma relativa imparcialidade do pesquisador frente à análise destas sociedades passadas. Agir de tal maneira não é necessariamente ser neutro em relação ao passado, mas ser imparcial em relação àquele universo do qual o historiador não viveu e não fez parte. Agir desta maneira não apenas garante o mínimo de objetividade possível na análise, interpretação e narrativa dos fatos do passado, mas configura uma condição imprescindível à toda e qualquer ciência humana e social, principalmente a História --- algo que não encontramos nos trabalhos da nova direita, pois suas narrativas situam-se à margem destas noções, destes critérios e destas condições de análise.
Julgar o passado com valores do presente é distorcer o passado; é impor ao passado determinadas características que não faziam parte daquele tempo. Quando a direita usa sua régua de conceitos baseadas em seus valores e princípios para analisar e interpretar o passado, ela incorre em um erro básico e grotesco de método e análise historiográfica. É por essa razão que todo esse atual “revisionismo histórico” feito pelos intelectuais orgânicos da nova direita --- a exemplo da tentativa de reinterpretação da ditadura civil-militar brasileira --- não tem aceitação e impacto na comunidade de historiadores, a não ser entre o público leigo em geral.
O que falta à onda revisionista da História encabeçada pela nova direita são noções básicas e elementares de Filosofia da História e historiografia, bem como das técnicas e métodos comumente aceitos pela comunidade de historiadores profissionais. Em suma, o que falta à nova direita brasileira é lapidar mais o seu parco conhecimento e trato em questões que envolvem as ciências humanas e sociais. Quando a nova direita brasileira sair da grande mídia e das redes sociais --- como canais do Youtube e páginas do Facebook --- e começar a frequentar círculos de historiadores profissionais, certamente apreenderão e dominarão os métodos, técnicas e vertentes historiográficas que lhe permitirão produzir narrativas históricas sem cair em constantes e grotescos anacronismos.
Ao seguir esse caminho, certamente a nova direita produzirá algo relevante e passível de aceitação e impacto na comunidade de historiadores. Com isso, a nova direita não precisará mais usar o argumento esdrúxulo de que as escolas e universidades são dominadas pela esquerda, justificando com isso o fracasso da inserção e impacto de suas interpretações narrativas históricas em livros-textos didáticos e paradidáticos utilizados em nossas escolas e universidades.
Referências
[1] Este artigo publicado em março teve duas versões: a primeira, mais resumida, foi publicada no site “Esquerda Online” em 13.02.2017, aqui: http://esquerdaonline.com.br/2017/02/13/dez-caracteristicas-por-tras-dos-discursos-do-mbl-e-consortes/. A segunda versão, mais completa e com observações complementares foi publicada aqui no site Bandeira Vermelha em 13.03.2017, aqui: https://bandeiravermelha.wixsite.com/vermelho/single-post/2017/03/13/11-CARACTER%C3%8DSTICAS-SUBJACENTES-%C3%80S-PR%C3%81TICAS-DISCURSIVAS-DO-MBL-E-CONSORTES .
[2] Ver as reações contrárias ao artigo supracitado na seção de comentários da versão publicada no site “Esquerda Online”.
[3] A pequena sinopse crítica do livro “Não, Sr. Comuna”, de Evandro Sinotti, pode ser lida aqui: https://www.facebook.com/notes/thiago-lisboa/pequena-sinopse-cr%C3%ADtica-do-livro-n%C3%A3o-sr-comuna-de-evandro-sinotti/1360639307295201/
[4] Sobre este, vale a pena conferir as seguintes obras: 1) “Los Métodos de La Historia: Iniciación a los problemas, métodos y técnicas de la historia demográfica, económica y social” (1976), obra conjunta com Hector Pérez Brignoli; 2) “Uma Introdução à História” (1981); 3) “Narrativa, Sentido, História” (1997) e 4) “Um historiador fala de teoria e metodologia: ensaios” (2005).
[5] Uma explicação simples, didática e ilustrativa sobre anacronismo pode ser conferida no vídeo “A definição de anacronismo e o exemplo do Brasil Colônia” feito por Felipe Nobre Figueiredo, mestre em história pela USP e autor do Canal do Youtube “Xadrez Verbal”, aqui: https://youtu.be/DEipnPVsPQk.
[6] Uma exceção à regra é o historiador e ex-professor da UNESP Marco Antonio Villa, que hoje tem um programa matinal de entrevista e opinião na Rádio Jovem Pan FM. As obras de Villa levantam teses muito controversas sobre os fatos históricos nacionais, sendo objeto de debate, críticas e objeções por parte de colegas de profissão, em virtude de erros factuais apresentado em suas obras. Sua obra “Ditadura à brasileira: 1964-1984, a democracia golpeada à direita e à esquerda” (2014) expressa um posicionamento aparentemente crítico em relação ao período marcado pela ditadura no Brasil, no entanto, o objetivo da obra consiste em criticar alguns fatos e consensos estabelecidos em pesquisas e interpretações historiográficas sobre o mesmo período, a exemplo da periodicidade do regime e do papel dos militares ao longo deste período. Com sua narrativa coloquial, despojada, adjetivante e direta à exemplo das obras pseudo-historiográficas do jornalista Leandro Narloch, as teses controversas de Villa conquistaram muito mais o senso comum e a memória coletiva brasileira do que os departamentos de História das universidades nacionais e internacionais.
[7] Conferir a este respeito o artigo do Instituto Mises Brasil intitulado “O pensamento econômico na Grécia antiga”. Neste artigo, os editores do Instituto enquadram Sócrates, Platão e Aristóteles na régua do que eles entendem a priori por capitalismo, liberalismo e estatismo. Com isso, a pseudo-análise reduz as importantes e abrangentes reflexões destes filósofos a uma perspectiva binária entre o que eles entendem por estatismo e liberalismo.
[8] Exemplos desse pensamento podem ser encontrados e detectados em qualquer produção teórica de qualquer organização ligada à nova direita, seja ela o MBL, o Instituto Mises Brasil, ou qualquer outra. As fontes utilizadas pela nova direita para formular esse pensamento são intelectuais orgânicos do capitalismo que levam o liberalismo econômico às últimas consequências, tais como Ayn Rand, L. Von Mises, F. Hayek, Hans-Hermann Hoppe, M. Rothbard, entre outros. Vale ressaltar que a variedade e radicalidade do liberalismo econômico dentro da nova direita cria subgrupos dentro dela própria, provocando tensões entre as correntes liberal clássica, ultraliberal, minarquista e libertária. A mais nova corrente criada pela nova direita chama-se “anarcocapitalismo”, cujo núcleo central consiste em edificar uma sociedade sem Estado, ocasião em que até o Poder Judiciário seria um serviço privado e regulado “racionalmente” pelo mercado, garantindo assim harmonia e paz social. Independente da vertente indicada, todas elas têm por fundamento e princípio apriorístico a defesa da propriedade privada e da livre relação de trocas no mercado.
[9] A questão da imparcialidade e da neutralidade nas ciências humanas e sociais é ainda objeto de profundo e intenso debate entre as comunidades de cientistas sociais em nível nacional e internacional. Apesar de não haver consenso sobre o assunto, no âmbito da ciência historiográfica, o cuidado com o anacronismo já permite uma mínima objetividade e imparcialidade na análise e interpretação dos fatos e acontecimentos do passado. Conferir a este respeito as obras de Ciro Flamarion Cardoso citadas na nota nº 3. Ver ainda o livro de E. H. Carr “Que é História?”.
Thiago Lisboa Cientista Social especialista em História Social Mestrando em Filosofia pela UFABC - Universidade Federal do ABC