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  • Clarice Catenaci

Mulheres e o Trabalho Doméstico


Estas mulheres, no entanto,

olham-me do interior de seus espelhos,

levantam um dedo acusador

e, às vezes, cedo a seus olhares de reprimenda

e gostaria de ter a aceitação universal,

ser a “boa menina”, a “mulher decente”

a impecável Gioconda,

tirar dez em conduta

com o partido, o estado, as amizades,

minha família, meus filhos e todos os demais seres

que, abundantes, povoam este nosso mundo” - Gioconda Belli

Comumente ouvimos que as tarefas do lar são trabalho de mulher ou que a limpeza da casa são “ajuda” de homens para suas companheiras. Da mesma maneira que as tidas obrigações maternas de uma mulher não devem ser aceitas como naturais, como características meramente orgânicas, as tarefas condicionadas a dona de casa também não, contudo é do senso comum associar uma eterna face feminina à atividades domésticas.

É importante lembrar que da mesma maneira que sistemas econômicos surgem e desaparecem, a qualidade das tarefas domésticas passaram por transformações ao longo da história. A desigualdade sexual, como conhecemos hoje em dia, não existia antes do surgimento da propriedade privada. Em algumas tribos originárias, o papel das mulheres nas questões domésticas era a de membros produtivos da comunidade e a divisão sexual do trabalho era complementar, e não hierárquica.

Com o desenvolvimento da sociedade capitalista, o trabalho doméstico é reforçado como o ideal de servir, a ideologia dominante condiciona a mulher a serva de seu marido. Em linhas gerais, na medida em que a industrialização avança, toda a economia se desloca da casa para fábrica. A produção econômica, anteriormente feita em casa, é transferida para a fábrica e a importância do trabalho doméstico decresce. Como tarefas domésticas não geram lucro, o trabalho doméstico vai sendo definido como uma forma inferior de trabalho. A separação geográfica entre local de trabalho e residência, conjuntamente com os novos métodos de produção, tiveram importante papel no processo de desvalorização do trabalho doméstico.

Neste contexto, uma nova configuração da classe trabalhadora no modo de produção capitalista não se forma igualmente para homens e mulheres. Este processo entre as mulheres também é constituído de forma desigual: parte delas são submetidas a desenvolver, em conjunto, uma jornada fora do lar e uma jornada doméstica; parte transforma-se, estritamente, em dona-de-casa condicionada aos afazeres domésticos; entre outras especificidades.

O ideário “dona de casa” refletia um emblema de prosperidade econômica, caracterizando mulheres que não tinham a obrigatoriedade de se submeter a empregos precários. A ideologia do século XIX constituiu a dona de casa e a mãe como modelos universais de feminilidade, apesar da clássica imagem “dona de casa” ter origem nas condições sociais da classe média. Tornou-se popular a representação de todas as mulheres em função dos papéis no lar.

Este ideário é transportado para classe trabalhadora. Na divisão social capitalista do trabalho cria-se empregos destinados a mulher e caracterizados como femininos: secretária, faxineira, professora. Mulheres assalariadas, submetidas a longas jornadas, condições de trabalho precárias e salários baixos, quando saem deste quadro, passam a ser vistas como invasoras do universo masculino.

Atualmente, com suas particularidades, a classe trabalhadora vive sua condição, entretanto é sobrepujada pelo ideário de uma classe dominante, expressando o sexismo em suas atitudes e posicionamentos. É importante relembrar as bases sócio históricas da submissão feminina a fim de descontruir concretamente uma ideologia dominante castradora de individualidades, potencialidades, e sociabilidades.

Para Saber Mais:

Angela Davis, "Mulheres, raça e classe"

Heleieth Safiotti “Gênero, Patriarcado, Violência”

Friedrich Engels “A origem da família, da propriedade privada e do Estado”

Clarice Catenaci Graduada em Ciências Sociais pela CUFSA - Fundação Santo André

Professora de Sociologia e Filosofia da Educação Pública do Estado de São Paulo

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