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  • Alan Peterson Lopes

Reflexões Sobre o Fórum Mundial da Água


Na semana do dia 18 a 23 de março de 2018 aconteceu em Brasília o Fórum Mundial da Água, o maior evento sobre o tema no planeta, reuniu mais de 150 países e teve público recorde de mais de 110 mil pessoas.

A estrutura do Fórum Mundial da Água contava com a Vila Cidadã e a Feira abertas a todo público, e a Expo e o Centro de Convenções, abertos somente a quem efetivou a “singela” inscrição no valor de 425 euros para participar.

O valor de inscrição já demonstra o real objetivo do Fórum, que ao contrário daquilo que parecer ser (nações preocupadas em garantir o acesso a água por toda população), foi realizar um grande evento de negócios em torno de tecnologias na área dos recursos hídricos.

Em uma semana de visitação, posso dizer que a Vila Cidadã apresentou propostas interessantes por parte da sociedade civil, como projetos simplificados de cisternas, filtros de água, temas de educação ambiental e experiências diversas da sociedade civil na melhoria da qualidade de nossa água.

Porém, as paredes da Vila Cidadã também deixavam claro o que ali seria discutido, publicidades do mercado da água bombardeavam o público, tais como a da Ambev que fez questão de dizer que 100% do lucro da venda da água engarrafada AMA é destinada a projetos de acesso à água potável por parte de populações carentes. Tais publicidades tinham um objetivo claro de criar um psicoesfera onde as empresas privadas têm a capacidade maior de gerir os recursos hídricos que os governos.

Na Feira, diversos estandes disputavam o público. A maioria deles fazia alusão aos benefícios de grandes projetos de investimento, como a Transposição do rio São Francisco. E nenhum deles promovia debates mais acessíveis ao povo sobre a importância da participação da sociedade civil na gestão e conservação dos recursos hídricos.

A Expo, o espaço privado que entrei com uma credencial emprestada pelos meus companheiros da SOS Mata Atlântica, era outro mundo, estandes de diversas nações, tecnologias sendo trazidas de todo o mundo. Por lá circulavam somente os engravatados que faziam fila nos coquetéis com vinhos portugueses e petiscos que nunca saberei o nome. Disputavam a atenção daqueles bem vestidos que demonstrariam interesse em adquirir novas tecnologias para implementar em sua empresa. Infelizmente, o mais importante do evento, a sessão de debates do Centro de Convenções não consegui participar porque, afinal, não dispunha de 425 euros no momento. E acredito que a maior parte da sociedade civil também não. Como resultado, decisões foram tomadas somente por aqueles que poderiam comparecer. Acordos internacionais e o futuro da água no planeta estavam em pauta, mas nem todos nós podemos participar. Mas em paralelo a este evento, acontecia em Brasília, também, o Fórum Alternativo Mundial da Água, esse sim com ampla participação da sociedade civil e populações tradicionais de diversos países. Realizado em uma estrutura muito mais simples, teve o objetivo de denunciar as ações das corporações da água pelo mundo. Nigéria, Chile, Bolívia, dentre outros países compartilharam conosco as angústias da água privatizada em partes de seu território, onde pessoas escolhem entre tomar banho, higienizar a casa ou irrigar a plantação de subsistência. Isso prova que a privatização da água não é um boato, ela vem com força neste momento e principalmente se instala nos territórios mais vulneráveis, pois na ótica do capitalismo, “onde há crise, há oportunidade”. Para denunciar os lobbys que se formam em torno do mercado da água e para pedir mais políticas de acesso, realizamos um ato em frente ao Congresso Nacional. Inflamos uma privada de 12 metros na Esplanada das Bandeiras pedindo por mais saneamento para a população. Com gritos de ordem, pedimos a garantia de acesso à água por todos no planeta, a não privatização deste bem e a recuperação e preservação de nossas florestas. Saio do Fórum Mundial da Água com mais questionamentos e preocupado com nosso futuro, a mercantilização da natureza parece ser um ciclo sem fim, já não basta os créditos de carbono, a precificação da terra, a biopirataria, etc., agora teremos que lutar para garantir a água tal como ela é, um elemento da natureza, um recurso para a vida e não uma mercadoria como querem àqueles grandes empresários que financiaram este evento. E como brasileiros, mais ainda temos que lutar, pois na geopolítica mundial, nosso território está entre os mais cobiçados. Nossa configuração territorial permite termos a maior extensão de terras agriculturáveis do planeta, a maior biodiversidade, a maior reserva de água doce de fácil acesso, grandes reservas de recursos minerais não explorados em nosso subsolo e importantes reservas de petróleo no pré-sal. E infelizmente, neste jogo geopolítico, estamos entregando de bandeja todas estas riquezas ao mercado mundial. Alan Peterson Lopes Graduado em Geografia pela UNESP - Universidade Estadual Paulista Mestre em Geografia pela UNESP - Universidade Estadual Paulista

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